segunda-feira, 8 de agosto de 2011

camilo e seide i





I.

"Eu estou morando às abas da Serra de Córdova, entre um souto e uma carvalheira. Sei todos os dias o preço do milho e do feijão fradinho. Tenho horas muito tristes, e outras muito resignadas. A felicidade é que eu não achei aqui, nem em parte alguma." (Carta a António Feliciano de Castilho, 6 Set. 1864).


II.

"Estou agora a ver se junto umas migalhas para comprar um cardenho entre dois carvalhos aí para o coração do Minho, e fechar-me lá, resguardado dos lobos e dos homens e das mulheres, com duas canastras de livros." (Carta a António Feliciano de Castilho, 16 Nov. 1865).


III.

"Eu penso ter já dito a V. Ex.ª que cismo em me ir embuscar numa floresta do Minho, ... Tinha 2 contos de réis de livros, economias de vinte anos de trabalho: começo a vendê-los para comprar uma horta. Enquanto uns fazem luz, eu vou fazer couve galega e repolhos das crónicas dos frades." (Carta a António Feliciano de Castilho, 31 Jan. 1866).


IV.

"Já cá estou na aldeia com as crianças e os passarinhos. Não sou o proprietário da casa e da carvalheira, que me enverdece o arredor do quintal; mas sinto a satisfação de não ser proprietário de coisa mínima, aqui donde olhos para coisas deste mundo, e me parecem todas pequeníssimas... / Sorriem-me dias e noites de muito dormir. Tenho um cavalo magro no intento de experimentar se a natureza, desajudada de pasto, o engorda. Não terei que me admirar se isto acontecer; por que maior milagre foi o das éguas lusitanas que concebiam dos ventos, exemplo que porventura devia servir para salvar a reputação dalgumas donzelas suspeitas de bons tempos de Viriato, é Plínio que refere o caso. / Aqui ninguém me pergunta se o Fontes dará cabo das Inscrições, nem se o João Crisóstomo voltará ao ministério, a provar que se pode com aquele sobrenome ter a boca cheia de guano político. Isto é que é estupidez santa, meu querido amigo! Quando V. Ex.ª quiser fazer-se por oito dias um homem digno deste país venha a Vila Nova de Famalicão, ou diga-me que vá ao Porto para lhe ensinar o caminho desta mata." (Carta a António Feliciano de Castilho, 15 Maio 1866).


Camilo Castelo Branco - Correspondência de Camilo Castelo Branco com António Feliciano de Castilho - I. recolha, pref. e comentários Alexandre Cabral. Lisboa: Livros Horizonte, 1985. (Obras Alexandre Cabral; 3)


Do projecto literário em curso

"Breviário Minhoto Camiliano"


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