LITERATURA E NATUREZA
"A gente das cidades pergunta-me em que país do mundo florescem, em Dezembro, bouças e montados. / Respondo que é em Portugal, no perpétuo jardim do mundo, no Minho, onde os inventores de deuses teriam ideado as suas teogonias, se não existisse a Grécia. No Minho, ao menos se buscariam águas límpidas para para Castálias e Hipocrenes. No Minho, a Cítera para a mãe dos amores. Nos arvoredos desta região de sonhos, de poemas, e rumores de conversarem espíritos, é que os sátiros, as dríades e os silvanos sairiam a cardumes dos troncos e regatos: que tudo aqui parece estar dizendo que a Natureza tem segredos defesos ao vulgo, e como a entreabrirem-se à fantasia de poetas. / Mas que flores... quer o leitor saber que flores vestem os calvos e denegridos cerros do Minho, em Portugal. São flores a festões, cachos de corolas amarelas em jardins: é a florescencência dos tojais, plantas repulsivas por seus espinhos, alegres de sua perpétua verdura, únicas a enfeitarem a terra quando a restante natureza vegetal amarelece, definha e morre. E desse privilégio como que o agreste arbusto se está gozando soberbamente, pois que vos amostra as suas pinhas de flores, e com os inflexíveis espinhos vos defende o despojá-lo delas."
Camilo Castelo Branco - Amor de Salvação. Lisboa: Círculo de Leitores, 1989, p. 11.
do projecto literário em curso
"Dicionário Temático Camiliano"
por Amadeu Gonçalves
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