Em Famalicão os cafés e os restaurantes, em épocas eleitorais, são fábricas de deputados e de bebedeiras [...] Padres, cheios de ideias e bifes de cebolada, fazem discursos com largos gestos, aquecendo as imagens com os cigarros que sorvem engolindo o fumo e a gramática num grande desprezo da moral e da sintaxe. São os futuros abades e cónegos. Braga tem exportado alguns oradores excelentes para estes comícios rurais. O povo das feiras escuta-os com atenção palerma, e parece que os acredita tanto nas estalagens como nos púlpitos. A religião e a política deste povo, pelo que respeita à consciência, é tudo o mesmo. O cristianismo é uam exterioridade de símbolos, sem ideia, sem convicção, com todos os prejuízos da Idade Média, e nenhum dos preceitos sociais da religião depurada pela joeira da filosofia. Aqui, de dez em dez anos, aparecem uns missionários que são uns Dantes extemporâneos na descrição miúda do inferno. Não ensinam, rugem horrores sempiternos, que perdem na fé dos ouvintes o que lucram na intensidade descritiva dos tormentos. Ora, «pregar não há-de ser praguejar», dizia Gil Vicente a D. João III dos frades de Santarém. Algumas mulheres, durante a missão, desprendem-se das obrigações domésticas, e ficam para toda a vida inúteis, em uma pasmaceira estúpida. Outras, não se rapam, nem se convertem; pelo contrário, depois de um grande misticismo, despapam-se na languidez da carne ociosa, e fazem asneiras como quase todas as ascéticas dos modernos romances - as Albinas e as Amélias de Zola e Queirós.»
do projecto literário
o minho de camilo
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